Na sequência das notícias veiculadas dia 11 de novembro, em vários Órgãos da Comunicação Social, onde a associação ambientalista Zero lamenta que a reciclagem se mantenha "vergonhosamente nos 21%" e que de nada tenham servido os 447 milhões de euros gastos para promover "uma política pública eficaz", cumpre à APA, enquanto Autoridade Nacional de Resíduos, esclarecer que a taxa de preparação para reutilização e reciclagem (PRR) atingida por Portugal em 2021 foi efetivamente de 32%, e caso sejam considerados apenas os dados referentes a Portugal Continental, o valor alcançado é de 33%.
Importa, ainda, clarificar que os valores não foram obtidos através de “contas mal feitas e manipulação” de dados, como referido nas notícias, na medida em que no Relatório Anual de Resíduos Urbanos de 2021 (RARU 2021), constam, com a maior transparência, todos os pressupostos utilizados para a aferição do cumprimento da meta PRR. De acordo com o disposto na Diretiva Europeia relativa aos resíduos, a partir de 1 de janeiro de 2027 só podem ser contabilizados para a meta os biorresíduos caso se tratem de resíduos recolhidos seletivamente, sendo que, até essa data, são admissíveis para a meta PRR biorresíduos provenientes da recolha indiferenciada.
Face a esta disposição, e nos termos da própria diretiva, que prevê o contributo dos biorresíduos provenientes da recolha indiferenciada para a meta, a APA entendeu manter e considerar os pressupostos já assumidos (e aprovados) em sede de PERSU 2020, pressupostos estes que, ao contrário do afirmado pela Associação Zero, em momento algum foram considerados inválidos pela Comissão Europeia.
Relativamente às “dúvidas sobre a qualidade dos dados disponibilizados pela APA” porque “a soma das percentagens dos destinos finais relativa aos anos de 2019, 2020 e 2021 nunca chega aos 100%” esclarece-se que, em alinhamento com a fórmula para o cálculo da taxa PRR, que determina que no denominador deve ser considerado o quantitativo de resíduos produzidos, também a análise por Sistema de Gestão de Resíduos Urbanos (SGRU) teve por base o quantitativo de resíduos produzidos, por SGRU, face ao resíduos que são efetivamente sujeitos a tratamento, valor este que consubstancia o numerador. Este ponto encontra-se, também, devidamente clarificado no RARU 2021, onde se referiu que esta é uma situação que acontece devido a armazenagem de resíduos, sendo que os resíduos que são geridos num determinado ano podem não coincidir com os resíduos efetivamente produzidos no mesmo ano.
A APA concorda com a Associação Zero, quando refere que “a política pública deve essencialmente investir na prevenção e reutilização, na recolha seletiva porta-a-porta, na compostagem doméstica e comunitária, no tratamento dos resíduos focado na reciclagem de qualidade, e na implementação do sistema de depósito e retorno de embalagens descartáveis de bebidas", motivo pelo qual o futuro Plano Estratégico para os Resíduos Urbanos (PERSU 2030), com publicação prevista para breve, se foca essencialmente na implementação da hierarquia de resíduos, perspetivando no contexto da prevenção a inversão da tendência de aumento da produção de resíduos que tem sido verificada ao longo dos últimos anos, através da implementação de medidas que fomentem o combate ao desperdício alimentar, a reutilização e/ou o prolongamento do tempo de vida de produtos.
Adicionalmente, e no que respeita à produção de resíduos, quando esta não possa ser evitada, prevê um reforço muito substancial dos quantitativos recolhidos seletivamente, com especial enfoque nos biorresíduos, com vista ao aumento da qualidade dos resíduos recuperados, condição essencial para a obtenção de produtos de maior valor acrescentado, fator chave para a transição para uma economia circular com um elevado nível de eficiência na utilização de recursos.
No que respeita ao Sistema de Depósito e Retorno (SDR), o mesmo consubstancia um instrumento que irá alavancar o cumprimento das metas, tanto ao nível dos resíduos urbanos como para as metas estipuladas para embalagens e resíduos de embalagens, incutindo na população melhores hábitos de separação e encaminhamento dos seus resíduos para reciclagem. Todavia, a transição para um novo sistema deverá ser feita sem disrupção, envolvendo todas as entidades e partes interessadas, razões que motivam a tomada de decisões ponderadas e o mais consensuais possíveis. Com este objetivo, as funcionalidades do sistema têm de ser desenvolvidas e aplicadas, as linhas de fabricação e cadeias de distribuição adaptadas e os consumidores informados, exigindo estas alterações um período transitório suficientemente dilatado.
A aplicação de todos estes instrumentos, incluindo os previstos no PERSU 2030 e a implementação do SDR, contribuirá de forma significativa para a redução da extração de matérias-primas primárias e também para a minimização dos impactes da deposição em aterro e do abandono de resíduos.
De referir, ainda, que tem sido e continuará a ser desenvolvido um trabalho robusto e articulado para uma alteração de paradigma, com envolvimento de SGRU e municípios, no sentido de definir a forma como cada um dos agentes dará o seu contributo para um aumento significativo da recolha seletiva, com a qual se potenciará um aumento da reciclagem e a diminuição significativa da deposição de resíduos em aterro.
Importa que a presente década consubstancie uma mudança muito significativa no setor dos resíduos, não só através da implementação dos instrumentos referidos, mas também através de um efetivo envolvimento do setor e da população na estratégia definida.
Para o efeito contamos com o contributo construtivo da Associação Zero.